Ao mestre de Königsberg, Immanuel Kant
I
Ouvir das coisas o que as coisas são,
nesse despir, metáfora em metáfora,
e só sobrar silêncios nessa ágora,
encapelando o mar de escuridão.
E desmontar do tempo as engrenagens
que um Deus austero tenha colocado,
varrer ruínas de um velho reinado
de rumos esboçados nas miragens...
Olhar sem medo a face desdobrada
dessa palavra, tinta de outra tinta,
fotografando a forma que pressinta
perder o mundo relido nalgum nada.
Parir o espanto, enquanto a imprecisão
dá seu recado e pensa nomear
o pensamento - e julga ser o ar
e a aspereza dos grânulos do chão.
Molhar o cosmo em causas e efeitos,
Titã numênico à vasta quintessência,
que ao mergulhar no sonho da potência,
faz trepidar o sono dos direitos.
Mas como se livrar dessas algemas,
querendo atravessar qualquer sentido,
até restar o incompreendido,
além da imprecisão dos teoremas?
Para cingir nas pausas em que cri
equidistante e perto ao pensamento
que só consegue alçar o firmamento
no labirinto atroz da coisa-em-si?
Enquanto a mente sempre se perdia
atrás de uma resposta, eu perguntava
em qual lugar secreto que ficava
a solução de toda antinomia.
II
"Olhando o vítreo altar do azul celeste,
quebrado nessa forma em que diviso,
conter, nessa sublime e meiga veste,
a cor de que se pinta o Paraíso,
como eu não posso me render ao doce
reino das ilusões, por vão que fosse?
Oh! Traquejo de cálculos perdidos,
titubeios chistosos de quem sente
ter o mundo, e depois entre os vencidos
tombar na aflição de um penitente!
Não importa a Razão, pois o que impera
é somente a incerteza da quimera!"
III
Naufragar no oceano da Incerteza,
negro mar que divisa uma batalha?
Tece a Mente sua própria mortalha
entre a Escuridão e a Clareza?
E das incompletudes indigestas,
que jazem no piar do desconforto,
eu quero o que sentiu a foz num Horto
das minhas sensações de ser-giesta.
Quero entender das coisas mais singelas
sem destruir o seu encanto breve,
nas erráticas soluções da neve
morrendo em água nas visões-procelas.
Condenado a sofrer como um errante,
a buscar todo o breve encantamento
das efêmeras coisas, no tormento
que retorna neste estro suspirante.
IV
Oh! Terei quantos dínamos e vórtices
adentrando nas chamas do perpétuo;
concluir o deslizar do que era reto
refrigerado nas coisas sem ter óbices?
Desvendar, por fim, na vastidão calada,
o meu grito sem eco nesse abismo
resvalar no perfeito mecanismo
qual se o silêncio fosse o Tudo e o Nada!
VITOR DE SILVA e GABRIEL RÜBINGER
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