Apesar de mais embaixo, ele é o coração do mundo
na parte mais grossa dele, destilo minhas poesias
macacos pedem-me cachos de versos com euforia
uma arara enrosca-se no galho com o olhar profundo
abro um leque da palmeira de sílabas que se casam
navego no rio Negro molhando letras com unguento
oxigeno o peito e me farto dos odores que exalam
para colher versos belos e plenos de sentimento
escondida pela mata vejo uma linda criatura
─ a Jurema, linda índia, com calças de brim desbotadas ─
(por que deixamos nossas raízes tão banalizadas?)
Isso desbota a minha alma, dando-me triste amargura.
Parei para descansar à sombra de uma amendoeira
em outra fiquei feliz mascando gostosas castanhas
achegou-se um miolo de bumbá em sua roupa festeira
o rapaz versava com rima numa cantiga estranha
─ Dona moça, vá visitar a Virgem de Nazaré
leve os seus medos e perfume-se de banho de cheiro,
acenda as velas para ela, peça-lhe um amor verdadeiro
nossa Santa é famosa e a senhora precisa ter fé!
Do alto para onde fui, avistei São Luís (do Maranhão)
— A cidade brasileira fundada pelos franceses —
um dia sofreu dos holandeses uma triste invasão,
mas foi retomada e colonizada por portugueses.
Jamais eu me esqueceria da beleza que é Teresina
capital do Piauí, com o seu corso tão democrático
que famílias inteiras dançam, num rodopio de mágico
e a vida também vagueia como se fosse uma menina
Segui um caminho árido e deparei com uma carcaça
os xique-xiques tortos, (que paisagem mais antiga!)
pareciam braços secos, mas sem qualquer ameaça
e o sol batendo a pino no meio daquela caatinga.
Voei como um colibri procurando paragens boas
caí nos braços do Atlântico, parei em praias formosas:
cheirei Maceió, adorei Recife, amei Aracaju airosa
bebi Fortaleza, engoli Natal, comi João Pessoa,
descendo mais, descansei um pouco e iniciei nova rota
encontrei Salvador, baiano bom, com a cara brava
─Pensei que tinha me pulado, sua poeta idiota!
─Jamais! Atei-me em seu pelourinho e agora sou sua escrava
enquanto corria com entusiasmo atrás de um trio elétrico
conheci um rapaz moreno lá das bandas das Gerais
o moço era um cavalheiro, coisa que nunca é demais
além do mais ele tinha um ótimo gosto poético.
Minas é berço de políticos e de outros movimentos
povo simples escondidos nos silêncios de seus atos
“liberdade ainda que tardia” é um sério juramento
observo o seu Belo Horizonte e apenas colho os fatos
deixo quieto os Ministérios, pois deles quero distância
não leio mais semanários, fecho os olhos para a mídia
“acabou a fome, o banditismo, as doenças, toda a insídia!”
Essas notícias eu quero e as crio no meu mundo de criança.
Agora meu voo é rápido pela linda Goiânia
que sina dessa moça que é o solo da poesia brejeira!
A vil rampa perto dela que tanto nos rouba e engana
aboleta-se numa brasília sem freio. Olhe a carteira!
Eu já me retirava, quando alguém puxou minha blusa
─ Sou apenas um bebê, quero ouvir suas palavras com calma
─ Tocantins, você merece não só palavras... Mas palmas!
Acarinhei seus cabelos e dele fiquei reclusa.
nasceu outro dia, vive no peito de um gigante adormecido
anda sem vacilar e não dá a ninguém nenhum cuidado
não se envolva com futrica, será sempre um filho amado
nasceu de um excelente estado, será um dia reconhecido
como em um parque infantil escorrego em uma montanha
os bichos coloridos fazem para mim uma festa
que aproveito a beleza que Deus agora me empresta
acaricio todos, sentindo harmonia tão tamanha
pois, Campo Grande é a própria imagem que ao seu nome se emposta
Capital do Mato Grosso, o do Sul, com sua fauna e flora.
Cuidando de sua árvore de cuias e do índio que ela adora,
o do Norte, capital Cuiabá[1], é uma mulher de quem se gosta.
Naveguei no Paraná, peguei um barco e curitibei
suguei aquela organização, que santa felicidade!
Saboreei vários pratos, com arame me operei
cheguei cansada e aportei numa alegre comunidade
o Rio Grande do Sul me esperava com sua cuia de mate
trouxe churrasco do bom e tropeiro numa terrina
subi o Guaíba para abraçar a loira Catarina
fisgou esse coração andarilho que ora é abrigo de vate
a bela possui dois filhos: o continente e a ilha
surfei com Joaquina e Consolação, amei Florianópolis
descansada, finquei pé no caminho mudando a trilha
preciso conhecer e acariciar as demais metrópoles.
Subi na quina do tempo que me jogou num abraço
senti tanto aconchego que me esqueci das mazelas
e o Cristo entristecido ao ver sua cidade numa cela
abraçava-me alegre, tirando-me todo o cansaço
purifiquei o meu espírito e resoluta fui à Vitória
todos lugares que passei, vi o meu povo cabisbaixo
apelei ao Espírito Santo e corri para o fim da história
enchendo-me de poesia e mais uma oração encaixo
minha
viagem acabei. Sentia um misto de alegria e angústia
respirei cultura no Masp, Paulista eu me vesti
fiquei fora algumas horas, qual o filme que não vi?
Bandeirantes desfilavam na Avenida, houve uma denúncia.
Acabaram-se as desgraças, o povo está liberto.
Só há político honesto, temos renovada esperança:
nas ruas não há mendigos, nossos portões estão abertos;
as cadeias viraram casas; só Deus é a nossa crença:
não há desempregados; mesa sem pão; não há viatura.
A polícia cuida do povo que anda tranquilo mal o dia desponta
há casais sob o luar e a vida anda na maior desenvoltura
guardei essas expectativas em um mundo do faz de conta
lamento que tudo tenha sido um sonho tão almejado!
Quando o mundo crer que aqui bate forte seu coração
dar-nos-á loas, porque ainda somos dele o pulmão,
e acredito que um dia verei esse País idealizado.
FIM
[1]- Cuiabá –
uma das versões da origem do nome é que os frutos das cuieiras que são grandes
e ovoides, quando secos, os indígenas usam como vasilhas. Costume preservado até
hoje, principalmente, pelos sertanejos do Nordeste brasileiro.
Fazendo jus ao nome artístico da poetisa, este poema longo em versos livres é uma alusão épica pela extensão e pela carga poética do tema brasileiro. Encontra-se na III E-Antologia de Poesia Retrô que você pode baixar AQUI.
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